segunda-feira, 23 de março de 2009

vem cá, me diz... por quê?

Nunca pensei que você faria isso comigo. Logo você. Me tornei a pior pessoa do mundo pra você...
Só pode ser isso. Um incômodo, um encosto, um empecilho. Logo você? Não esperava. Sinceramente, não esperava. É... O tempo passa. E a gente aprende que as pessoas não são tão bobinhas assim. Você não sabe o quanto tá doendo em mim escrever isso. Te amo, acho que você já deve saber há algum tempo.
Mas às vezes acho que só isso não adianta.

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Não

Não há banda. Impera o silêncio na redoma de gesso, tijolo e madeira. Verdade seja dita às nádegas que ocupam o recinto: sim, algo elas ouvem. Não há banda, mas as bundas notam a presença de sons. Os acordes desencontrados de uma melodia infernal são o perceptível contraste ao pseudopuritanismo que invade aquela gente. E o fato é que há gente. Há suor e saliva em seus corpos amontoados. Propositalmente (ou não), um cotovelo moreno encosta outro: abre-se o portal. De lá, contornos sub-humanos passam a existir. Uma moça. Sozinha. Dispara-se um sussurro infantil, audível a todos, inclusive à miserável que adentrara a Casa: "Como é feia!". Não há beleza. Nem banda.
A coitada se move. Há um nítido desconforto cobrindo seus poros. Algo afeta esse não-ser: é o quê? Será a umidade abafada, característica da cidadela do interior? Pouco se sabe. A pobre se desloca com dificuldade. A quase-mulher ainda sozinha está. Desgrenhada. As nádegas, o suor e a saliva param de respirar e ninguém sabe quanto tempo passou. Com toda a certeza, o observador onisciente desta cena enervante mira o relógio (de bolso, comprado em mil novecentos e vinte e oito) e exala impaciência. Não há banda, nem beleza.
Não, não há banda, pois essas coisas custam dinheiro. Um desprezível toca-fitas arranha a atmosfera da Casa e todos se incomodam com o som renitente. Magicamente, nada se manifesta. Cerca de onze pescoços, no entanto, ainda estão virados. O curioso é que eles realmente se esforçam para assistir à Demência Motora. Motivo: o arrastar de suas sandálias sujas é tão vagaroso que, mesmo transcorridos oitenta e nove segundos, a figura da Demente ainda não atinge o campo de visão dos primeiros ocupantes do local. Ademais, a negação emocional parece um disparate à ocasião. Não há ocasião, porém. Nem beleza. Nem banda.
A coitada sofre e sua. Aquele não é seu dia. Não é um momento único, pessoal, inacabável enquanto dura. E que logo se esclareça: esse momento não pertence a nada, nem a ninguém. Só acontece. Faz-se profundamente necessário ao universo. Somente àquele universo de gente, suor, nádegas e saliva. Aquele momento importa, porque algo está acontecendo. Jamais acontece coisa nenhuma na vida do letárgico não-ser. Diz pra si mesma que é quase-mulher, mas, em breve, será o quê? Quase-coisa-alguma.
Eis o seu momento periclitante. A Demente desfalece em lágrimas. Suas fíbulas amorfas descontrolam seu equilíbrio. Ela é frágil. No (até então, ausente) cérebro, o labirinto se perde. Sua derradeira caminhada é interrompida. A criança, que sussurrava há cinqüenta e dois segundos, põe-se de pé. Não há nada além de seu desejo (reprimido pela falsa aura de bondade) de que a pobre vá ao chão.
A coitada resiste. Sua quase-alma se desconecta do limbo e retorna à Casa. Bastam poucos passos, ela pensa. Enquanto isso, o descrente observador está crente que crer só aliena. O relógio de bolso comunica ao seu par de olhos emoldurados pelos aros pretos: faltam dez segundos. Nesse curto intervalo de tempo, tudo acontece. A criança, os cotovelos morenos e o toca-fitas estancam. Um homem desimportante cumpre seu papel e se adianta à Demente, oferecendo sua mão direita. Algo reluz nas proximidades do quarto metatarso desse pigmeu, miúdo de corpo e de mente. Demente, demente!: o apelido se consolidara entre os dois. A fêmea-espectro percorreu sozinha todos aqueles centímetros... Que lástima para sua finita existência! .Por que, como de costume, não foi amparada por um pai virtuoso que enlaçasse seu rádio, sua pata, sua ulna... até lá?
A quase-alma torna-se, triunfante de sua libertação, alma. A pobre coitada se vai. Morre com os olhos abertos, vidrados num imponente vitral: sua última visão em vida. Um: não há beleza, ocasião, banda. Dois: não há mais fé na Casa. Pois, então, o que descansa inerte no chão de tábua corrida do Lar dos Mitos? Três: tudo o que não é vida. Quatro: não há Cilenne, Jussara, Cheyenne; não há Mariana. Cinco: não há desespero. Seis: não há medo do que seus passos lhe custariam. Sete: não há mais moça, coitada, humilde ou soberba. Oito: não há mais moça feia. Nove: nem mesmo noiva há.





Dez:
Não há mais nada além do além.

sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

"Says she's a poet
This time she's gonna blow it
'Cause she's dancing with her ego
She took a vow of silence
When she reads her work to me
She swallow words like a
Placebo"

nunca esses versos foram tão adequados.
~

Os pedidos chegaram e ela provou novamente o picadinho francês de legumes batizado com nome chique. Tudo que era francês era chique. O gosto, todavia, desagradava as papilas gustativas da mulher. Resolveu engatar uma conversa mais longa do que os comentários esparsos do início da noite. Perguntou o que ele tinha achado do filme. Eduardo respondeu que havia sido legal (para total aborrecimento de Alice).

- Legal??
- Certo, foi o melhor filme que já assisti. – a voz era, mais do que nunca, sarcástica.
- Não pode dizer isso de forma mais romântica?
- Foram as melhores duas horas da porra da minha vida!
- Muito melhor! – sua aprovação era sincera.

O ratatouille ganhou mais sabor.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Desconfiado?

Você acorda. O corpo inteiro descansa. Nada se move. As pálpebras grudadas pesam, cismam em fechar. É o espetáculo da sua fraqueza nos instantes de preguiça irracional. Você não quer ninguém por perto: o despertar requer uma privacidade inabalável. Apenas as cobertas e os números digitais do despertador deveriam te encarar. 5:47. Uma solenidade se desenrola, mas o contexto parece negligenciar esse seu momento.
Um som tímido desperta sua atenção. O corpo permanece imóvel. Alguém está no quarto. O ambiente encolhe, tudo se torna subitamente úmido. Uma respiração ofegante. Você sente o cheiro de perigo. Abruptamente, abre a gaveta. O braço esticado tateia um objeto no fundo e a poeira toca seus dedos.

Besteira qualquer. Vento, vulto, estalos que ninguém explica.






Desconfiado?

sábado, 8 de dezembro de 2007

Um brinde

Eu não deveria ter trazido essa caneta. O lápis ficou em casa, não posso apagar essas linhas e estranho muito minha letra. A paisagem é mágica. Os sons são esperados e descontínuos. O pulsar do coração também. Descalça, de ombros curvados e com calor (atenuado pelo vento tímido que dança nas minhas costas). Eu não podia ficar em casa. Lá só encontraria desvantagens sufocantes. A luminosidade me agrada e descubro exatamente nesse instante que o sol traiçoeiro resolveu brilhar demais. Meus olhos sofrem. O corpo todo pulsa dor e desconforto.
Pausa.
É extremamente revoltante o fato de eu não conseguir mudar no momento em que mais preciso. E agora, às vésperas do fim do ano (!) é a época exta, propícia, para repensar pela 537º vez as minhas atitudes e características mais notáveis.Uma moça baixinha veio me perguntar se eu me incomodaria em aparecer na TV.Um VT de fim de ano. Tentativa de captar uma espontaneidade absurdamente calculada. Sinto-me observada e o homem com a câmera aponta pra mim.. (Eles conversam baixinho, discutindo o ângulo de filmagem mais adequado.) Meu nariz aparecerá colossal e meus dedos do pé estarão à mostra.
Pausa.
Filmagem finalizada. Será que eu ainda me lembro de discutir o interior? O mundo externo me chacoalha e hipnotiza um eu-lírico já bastante perturbado.
Que perfume gostoso essa agenda tem!
Cheiro de bebê. De passado.
Acho que a reflexão está louca pra sair e discursar num caixote velho para uma platéia de um só ninguém.
Preciso escolher entre a autenticidade íntima ou a que gosta de se revelar.
Parece que mudei muito sempre sendo a mesma.
Eu me distraio tão rápido em situações de gritos e tremeliques, guardo coisas (exclusivamente minhas, deveras banais), permaneço insegura e nada independente, falo demais em momento incertos, fico tímida e na redoma de poucos amigos e me calo.Sou grosseira. Penso demais em mim.
Eu queria ganhar de presente uma Belle graciosa e comunicativa. Atenta, paciente, OTIMISTA, partidária do Segredo.
16:46.
Tenho sede e preciso de um banho. Queria menos apatia.
O frio e o calor nunca foram tão semelhantes... Se me envolvo num transe de rotina, no modo automático, e me importo tão pouco com o mundo alheio, como posso guardar um fúria cor de rubi que desmonta o castelo de gelo e se desmancha logo em seguida?
Sou quente, fria, quente, fria.
E tudo é concomitante.
Será mesmo difícil de toda essa dubialidade me desvencilhar?
É preciso. 2008 quer chegar com pressa e o eixo de felicidade e método pretende se estabilizar.
Brindar comigo à properidade - ao equilíbrio.

terça-feira, 27 de novembro de 2007

Noticiário pitoresco

*
Estranho seqüestro de Dercy Gonçalves

Às vésperas de completar 129 anos, Dercy Gonçalves ainda está desaparecida.A sorridente comediante foi surpreendida em sua própria residência enquanto sua acompanhante tomava banho e o porteiro assistia ao jogo Brasil x Argentina. O nome da seqüestradora ainda não é sabido, mas as câmeras do circuito interno revelam uma senhora de cabelos grisalhos com uma inconfundível tatuagem na perna esquerda.Dercy está há suas semanas presa, e o pedido de resgate não é nada simplório: 10 mil reais em dinheiro vivo. Como Dercy não possui muitos familiares, é bastante provável que a seqüestradora misteriosa não tolere muito tempo e faça logo o serviço que Deus tanto demorou a executar.

**
Jovens de 17 anos provocam reboliço no Palácio da Algazarra

Estudantes de um renomado colégio católico de Brasília organizaram um protesto contra o sistema de cotas. Ontem, esses jovens conseguiram, de fato, chamar atenção. Após tapearem seus professores, escaparam das aulas e utilizaram o carro do diretor da escola Sr. Gumercílvio Silva, para chegarem ao Palácio. Pequenos porcos de pelúcia e rolos de papel higiênico usados foram arremessados em direção ao gramado. O organizador do protesto foi o estudante Bernardo Peixoto, que acaba de ser expulso do colégio. Por conta de vandalismo e furto de automóvel, os sete estudantes serão interrogados e conversarão com o Ministro da Educação, Sr. Analfabelardo Pinto. Os porcos de pelúcia foram recolhidos e devidamente doados a orfanatos das cidades satélite.

***
Trabalho de grupo da sexta série, por aí. Textos by me. Hahaha!

sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Victoria's Secret

O segredo de Victoria
Ninguém ousa desvendar.
O misterioso mundo rosa
Não se abala, só pensa em recrutar
Criaturas bobas, verdinhas, que há pouco pulsam
E desejam a existência
Preciosa

Esse segredo fascina os olhos das meninas
Atrai, sugere com brilhos mil
Um perfume artificial de cereja
Insinua uma estética vil,
Suposta forma de expressão.
Porém, fez-se mister
Uma produção em série alucinada
De bonequinhas de luxo vão

O segredo de Victoria é só mais um
Entre os artifícios e brinquedinhos assaz envolventes
Que seduzem e sugerem que isto é melhor que aquilo
O que deve ou não ser consumido
Apenas por conta de graciosos títulos

Por que valorizar somente
O impecável-especial-caro-demais?
Essa mania afoga, assopra
A chama morna e tímida
Que ainda acredita na diva escondida
Por trás de tanta pompa e quero-mais.